19 de fevereiro de 2024

Andrade Gomes | Notícias

PROFILAXIA DO LIMBO PREVIDENCIÁRIO

Inicialmente, necessário entender de forma objetiva o que caracteriza o denominado “limbo previdenciário”: É o período em que, por ausência de deferimento ou prorrogação de benefício previdenciário, o empregado, considerado inapto para o trabalho pelo empregador, fica sem direito ao benefício previdenciário e também não recebe seus salários.

Ao fim e ao cabo, a consequência básica do limbo previdenciário é a responsabilização do empregador pelos salários do período em que o empregado deixou de receber sua remuneração após o 15º dia de afastamento ou no caso de recusa na prorrogação de benefício, tendo em vista o INSS o considerar apto para o trabalho,

Dois são os fatores que levam à responsabilização do empregador. O primeiro, baseado na presunção de prevalência do parecer médico do perito do INSS. O segundo fundamento, jurídico, é a atribuição do ônus do negócio ao empregador, a teor do artigo 2º, da CLT, que dispõe que o empregador assume os riscos da atividade econômica.

E é fato que, há anos, com o endurecimento pelo INSS na análise de afastamentos, tem-se, por consequência, aumentado progressivamente as situações de limbo previdenciário. Registre-se que o limbo previdenciário ocorre sobretudo com médias e pequenas empresas, notadamente porque é comum essas empresas não terem serviço médico e de segurança de trabalho próprio, utilizando empresas “especializadas” em assistência em medicina e segurança do trabalho.

Pois bem, ocorre que, como regra, essas empresas de assessoria em medicina e segurança do trabalho prestam serviços superficiais que não levam em conta a necessidade de aprofundamento de pereceres médicos com laudos e exames complementares que auxiliem na análise do perito médico do INSS sobre a situação do empregado a ser afastado, e quase sempre atuam de forma burocrática e sem se preocupar com as consequências para seus “clientes” pelas situações de configuração de limbo previdenciário.

Portanto, antes de mais nada, imperioso que os empregadores passem a ter maior cuidado na contratação dessas empresas especializadas em saúde e segurança do trabalho, inclusive como forma do mercado obrigar uma mudança de postura e atuação destas empresas. É preciso encarar a assistência de empresas de assessoria de saúde e segurança do trabalho, ou a contratação de médicos do trabalho, mesmo quando não haja a exigência legal, como um investimento imprescindível para, não só cuidar da saúde dos trabalhadores, mas evitar prejuízos muitas vezes elevados decorrentes do limbo previdenciário. E também para evitar prejuízos decorrentes de indenizações por responsabilidade civil. As hipóteses de responsabilidade civil por doenças relacionadas ao trabalho têm aumentado seu espectro em razão do reconhecimento, inclusive legal, de muitas enfermidades como associadas ao trabalho, mas este é um assunto para outra oportunidade, embora da mesma forma muito importante para o investimento em cuidados adequados de saúde e segurança do trabalho pelos empregadores.

Posto isso, importante entender os requisitos para que ocorra o afastamento pelo INSS, as obrigações legais do empregador e as ações práticas necessárias para evitar o limbo previdenciário.

São requisitos para concessão do auxílio doença:

1 – Carência de 12 meses de contribuição (Artigo 59, da Lei 8.213/91), salvo hipótese de acidente do trabalho ou doença isenta de carência (Artigo 152, da Instrução Normativa 45/2010 do INSS).

2 – Incapacidade para o trabalho por mais de 15 dias, portanto, a partir do 16º dia (Artigo 60, da Lei 8.213/91).

3 – Encaminhamento ao INSS para análise pericial (§4º, do artigo 60, da Lei 8.213/91).

Existem ainda duas hipóteses excepcionais previstas em lei para concessão de benefício previdenciário por atestados intercalados.

  • Novo afastamento no prazo de 60 dias pelo menos motivo após afastamento de 15 dias (§ 4º, do artigo 75, do Decreto 3.048/99).
  • Novo afastamento no prazo de 60 dias pelo mesmo motivo, após afastamento inferior a 15 dias, quando o período somado dos afastamentos for superior a 15 dias (§ 5º, do artigo 75, do Decreto 3.048/99).

As obrigações do empregador se iniciam no encaminhamento do empregado incapacitado ao INSS. Nesse sentido, o citado §4º, do artigo 60, da Lei 8.213/91, dispõe expressamente acerca da obrigação do empregador no encaminhamento do empregado ao INSS após o 15º dia de incapacidade. Portanto, ainda que a marcação seja feita pelo empregado, fato é que o empregador é o responsável pelo encaminhamento do trabalhador ao INSS após o 15º útil de incapacidade.

Mas como já dito, não basta o encaminhamento. Diante do rigor cada vez maior do INSS na análise de incapacidade, sobretudo nas hipótese de doenças comum, e diante da possibilidade de limbo previdenciário, evidente o interesse do empregador no êxito do afastamento do empregado para percepção do benefício previdenciário.

Nesse sentido o acompanhamento do afastamento também se torna imprescindível, já que são diversas as situações possíveis no processo perante o INSS.

Com efeito, o empregado poderá a qualquer momento ser convocado para nova avaliação, mesmo após a concessão do benefício (§ 10º, do artigo 60, da Lei 8.213/91).

Note-se, por oportuno, que no ato da concessão do benefício, sempre que possível, deverá ser fixado o prazo estimado para a duração do benefício ((§ 8º, do artigo 60, da Lei 8.213/91) e, quando não fixado, o benefício cessará após 120 dias contados da data de concessão ou de reativação do auxílio doença (§ 9º, do artigo 60, da Lei 8.213/91)

O empregado que permanecer incapacitado poder pedir a prorrogação do benefício no prazo de 15 dias que anteceder a cessação do benefício (§ 2º, do artigo 277, da Instrução Normativa 45/2010 do INSS).

Por fim, há expressa autorização legal de retorno do empregado ao trabalho na hipótese de impossibilidade de realização do exame médico pericial antes do término do período de recuperação indicado pelo médico assistente que fez o encaminhamento ao INSS. Esse retorno deve se dar no dia seguinte à data indicada pelo médico assistente como período de recuperação, mesmo que mantida a necessidade de comparecimento do segurado na data agendada para a perícia (§ 6º, do artigo 75, do Decreto 3.048/99). Registre-se, que, neste caso de retorno antes da perícia médica, necessária a realização de nova avaliação médica para verificar a aptidão do trabalhador.

Assim sendo, certo que o acompanhamento de todo o processo do empregado no INSS, também após o seu encaminhamento, é questão de grande interesse do empregador.

Em conclusão, podemos estabelecer que são basicamente três as ações factíveis para prevenir o Limbo Previdenciário.

1 – Atuação proativa da empresa no acompanhamento passo a passo da situação da saúde do trabalhador, no seu encaminhamento se incapacitado para o trabalho por mais de 15 dias, e durante todo o processo perante o INSS.

2 – Atuação ativa e efetiva do médico assistente do trabalho (empregado ou de empresa de assessoramento) mediante análise clínica completa, solicitação de exames médicos complementares se necessários, elaboração de laudo circunstanciado para encaminhamento do empregado ao INSS se for caso de incapacidade por mais de 15 dias, mas, principalmente, a gestão de todo esse processo junto com o empregador.

3 – Por fim, diante das várias nuances legais, também não se pode deixar de frisar a necessidade de uma assessoria jurídica adequada. Mesmo porque, além dos recursos em esfera administrativa, toda essa situação legal sempre poderá ainda ser discutida judicialmente.

Por todo exposto, vemos que, embora seja realmente trabalhoso e demande investimentos, há remédios reais e efetivos para se evitar o Limbo Previdenciário.

Renato de Andrade Gomes – Sócio da Andrade Gomes Advogados Associados